A Inauguração da Congregação Kadoorie Mekor Hayyim do Porto.


Esnoga Kadoorie Mekor Hayyim


Neste mês de Maio, traremos na integra uma matéria sobre a inauguração, em 1938, da Sinagoga Kadoorie Mekor Hayyim no Porto em Portugal. Escrito pelo Senhor Paul Goodman, advogado inglês que teve a honra de presidir a The London Marranos Committe.


O artigo, parte da edição de Janeiro e Fevereiro do periódico Ha Lapid, além de falar sobre o hercúleo esforço do Comitê para trazer ao judaísmo aos Cripto-judeus portugueses, trás o relato sobre a luta do Capitão Barros Basto Z'l, em prol da causa judaico-portuguesa, que com brio, culminou na Construção da Grande Catedral Judaica do Norte, na cidade do Porto.
Não obstante o valor histórico do artigo na sua integra , destacamos alguns pontos, que são de deveras importância para o completo entendimento do que aconteceu em Portugal na primeira metade do século XX, no que diz respeito ao Judaísmo.
   Pontos Importantes:
A mobilização da Comunidade Judaica Hispano - Portuguesa de Londres, Amsterdã e de Nova York, na busca de uma solução para os "marranos” que desejassem retornar ao Judaísmo;
A postura das Comunidades Judaicas antes e depois da criação do estado de Israel em 1948. 
Entendendo o que ocorreu
A Total destruição das comunidades sefardita na Europa durante a Segunda Grande Guerra, fator este que culminou no massacre de milhares da Nação Israelita Portuguesa, arrasando escolas e exterminando Sábios, enfraquecera brutalmente a autonomia dos Judeus Hispano-Portugueses, que passaram a serem ensinados, seja em Israel, ou onde quer que se refugiassem, pelo Mundo, no sistema asquenazita e por fim, sendo, politicamente, substituídos em sua identidade cultural pelos judeus orientais.
Assim, o termo Sefardita, antes empregado a todo judeu, cuja origem remontava as comunidades judaicas da Ibéria, passou a ser sinônimo de Judeu Oriental.

Envolvimento dos Grandes nomes das Congregações Israelitas Hispano e Portuguesa em prol da causa

 Importante
É importante salientar, que a autonomia, uma antes absoluta de cada comunidade Judaica, rendeu-se a soluções prontas, ditadas por um Rabinato pretenso a status quo de Sinedrio, e que pouco se esforça para entendem a problemática anussim, fornecendo soluções que vão contra as responsas de nossos Sábios de Bendita Memória, pondo por exemplo a conversão, quase sempre travestida de Retorno como solução aos anussim.¹


Nesta questão, veremos que a posição das comunidades judaicas NÃO Hispano e Portuguesa, sempre foram de "exigências de provas" que nem sempre as mesmas poderiam apresentar se questionadas.
Como observa Dr. P. Goodman Z'l (...) “Se estes escrúpulos (se desfazendo, muitas vezes, das opiniões dos Sábios do Talmud, de Bendita Memória, em nome de uma conveniência rabínica moderna) tivessem sido aplicados rigorosamente aos refugiados de Espanha e de Portugal no século XVII, as Comunidades Sefardita de Amsterdam, de Londres e doutros Lugares, dificilmente se teriam organizado" (...). 
Bessiman Tôb !
 ATT. A Voz da Nação
Os Marranos Portugueses 
Por Paul Goodman

Por uma feliz coincidência, o 500° aniversário do nascimento em Lisboa de Don Isaac Abrabanel, o maior dos exilados de Sefarad, acaba de ser comemorado em Portugal com a abertura solene duma Sinagoga no Porto, edificada principalmente para os marranos que regressaram  ao judaísmo durante as ultimas décadas.
A história dos Marranos é agora acessível aos leitores Ingleses pela brilhante obra do Dr. Cecil Roth, editado pela Sociedade de Publicações Judaicas da América em 1932.
No epílogo intitulado: Os Marranos de Hoje, o Dr. Cecil Roth relata a espantosa sobrevivência destes numerosos cripto-judeus que guardaram uma consciência  judaica e a prática de ritos judaicos após mais de quatro séculos de terror e de repressão. E ele conclui: Quanto às últimas conseqüências deste espantoso movimento, é ainda demasiado cedo para fazer um juízo.
Após a minha primeira visita aos marranos portugueses em 1931, eu expunha no Jewsh Chronicle de (Outubro de 1931) o resultado do meu inquérito do Porto, Bragança e outros centros marranos, especialmente  em conexão com a obra realizada graças à ajuda do Comitê dos Marranos Portugueses de Londres, o qual foi constituído conseqüentemente à missão empreendida em 1925 pelo saudoso Lucien Wolf, pela iniciativa  da Aliança Israelita , da Anglo-Jewsh Association e da Comunidade Hispano-Portuguesa de Londres.
Fiquei comovido, como qualquer outro visitante judeu o teria sido, pelo lado romântico dos últimos sobreviventes do que foi outrora uma grande e poderosa seção do povo Judeu.
Para Dizer a verdade, fui profundamente perturbado pelo vasto problema que se me apresentava como Insolúvel.
Não só o Comitê Londrino dos Marranos Portugueses não tinha à sua disposição senão fracos meios, mas era preciso tomar cuidado de não resolver as cinzas do fanatismo religioso num país onde os judeus são agora livres e gozam amplamente de todos os direitos de cidadão. A experiência de alguns anos tinha provado , além disso, que se o regresso dos Marranos suscitou certo interesse, foi antes em razão do seu caráter exótico, mas não provocou nenhuma ajuda substancial. Era preciso pois registrar o triste fato que o judaísmo, como religião, tinha aparentemente cessado de gerar este espírito de vanguarda que se nota entre os Haluzim (pioneiros) do renascimento nacional na Palestina.
Quando no decurso duma visita a Brastilava, vi o Rabbi Akibah Schreiber, o chefe da dinastia rabínica de Chatam Sofer, este último, embora se mostrando interessando pelos anussim (convertidos à Força) de Portugal, manifestou , do ponto de vista halachico (jurisprudência Judaica)  uma atitude crítica em face dos marranos regressando ao judaísmo. Não há nenhuma dúvida que a questão genealógica dos marranos levantou problemas que vão provocar interessantes Checloth -u -Tschuboth (perguntas e respostas em matéria jurídica judaica).
Se estes escrúpulos tinha sido aplicados rigorosamente aos refugiados de Espanha e de Portugal no século XVII, as Comunidade Sefardita  de Amsterdam, de Londres e doutros Lugares, dificilmente se teriam Organizado
 Os problemas imediatos foram resolvidos pelo Comitê dos Marranos Portugueses, que concentrou os seus esforços no Porto, a Capital do Norte de Portugal.
 O Porto torna-se o quartel general de atração para os grupos marranos que desejem manter o contato com o mundo Judaico. Os Marranos nestas regiões, quase inaccessíveis, vivem num crepúsculo de superstições judias e católicas. O Porto tem uma população judia que apesar da sua composição heterogênea, tem os aspectos duma comunidade estável e a recente chegada de judeus do Galúth Askenaz, constitui um elemento apreciável para difusão dos conhecimentos e práticas Judaicas.
 A Alma desta obra de redenção é o apostolo dos Marranos o Capitão Artur Carlos de Barros Basto (Abraham Israel b. Rosh), que é não só um valente militar, que serviu com uma grande distinção no front britânico das forças expedicionárias portuguesas em França, mas também uma figura heróica, recordando os românticos Sefardim da fé judaica cuja  Constancia e dedicação brilharam através das trevas que envolveram o povo judeu durante séculos, após a grande expulsão de Espanha em 1492.
 Nascido Marrano e admitido oficialmente no judaísmo em Dezembro de 1920, com uma admirável dedicação, manteve firmemente a causa judaica entre os seus irmãos marranos nos bons e maus momentos.
A vida agitada da comunidade nascente do Porto, a cidade natal de Uriel da Costa, recorda os princípios agitados das Comunidades Sefarditas da Diáspora.
O Capitão Barros Basto visita de tempos a tempos os diversos estabelecimentos marranos para proclamar a fé que nele existe. Publica um periódico intitulado - Ha- Lapid (O Facho) - que forma um traço de união entre os marranos portugueses e o mundo judaico em geral.
 Foi o Capitão Barros Basto  que tomou a iniciativa de edificação duma Sinagoga no Porto, que, pela grandeza do seu estilo, se devia tornar a Catedral Judia do Norte de Portugal. Os meios postos à sua disposição eram dos mais modestos e durante anos tinha-se notado que o edifício começado a 1 de Julho de 1929, se apresentaria como uma ruína melancólica, testemunhando a falta de interesse manifestado por este objetivo eminentemente judaico por aqueles  de que se esperava uma ajuda efetiva.
A  pedido do Sr. Israel Levy, Rabbi  mór de França  (um dos membros do Comitê dos Marranos Portugueses), o falecido Barão Edmund  Rothchild dera 500 Libras para o fundo de construção, mas o seu não foi seguido por ninguém.
 Felizmente, o Comitê pôde interessar na obra a Família Kadoorie de Shangai.
 Os Srs. Horace e Laerence Kadoorie forneceram todos os fundos necessários para o acabamento e arranjo interior do edifício em honra de seus pais Sir Elly Kadoorie e da finada Laura Kadoorie.
 A edificação desta importante Sinagoga, símbolo do despertar judeu entre os Marranos Portugueses e testemunho triunfante da solidariedade de Israel, é, nestes dias agitados, uma das realizações judaicas mais encorajantes.
A Consagração da Sinagoga Kadoorie do Porto a 16 de Janeiro de 1938, constituiu um ato histórico. Ele abrirá, é precioso esperá-lo, uma nova e Feliz época nos trágicos anais do judaísmo Português.
Este dia coincidiu com o ha mishah  assar bishivat (o dia novo das Árvores) E do bom augúrio para o futuro dos marranos portugueses. Possa ele engrandecer e florescer para a gloria de Adonai.
O Grande Deus de Israel!
Bessiman Tob
Agradecimentos:

H. Luciano Mordekhai haLewi de Lopes ס"ט -  por cópia do artigo de Paul Goodman Z'l.
Sr. Simon de Albuquerque Senior ס"ט - Pela a adaptação do texto ao Português vigente no Brasil.
Fonte: Barros Basto - Ha - Lapid (O Facho) Jan - Fev de 1938.
(¹) Tema que será tratado mais detalhadamente nos próximos artigos